Adolescentes e companheiros de IA tornaram-se tema central de debates sobre tecnologia, educação e saúde mental.
Um estudo nacional conduzido pela Common Sense Media em 2025, com 1.060 jovens entre 13 e 17 anos nos Estados Unidos, revelou que 72% já utilizaram essas plataformas, enquanto 52% são usuários regulares que interagem algumas vezes por mês.
O fenômeno cresce em meio a preocupações com privacidade, desenvolvimento emocional e segurança digital.
Crescimento do uso e motivações
Primeiramente, os dados mostram que 13% dos adolescentes usam companheiros de IA diariamente, sendo que 21% interagem algumas vezes por semana. Essa frequência elevada demonstra como esses sistemas já se inserem no cotidiano juvenil.
Embora 28% nunca tenham recorrido a tais ferramentas, a maioria experimentou ao menos uma vez, seja por curiosidade ou entretenimento.
Além disso, as razões apontadas para o uso vão além da diversão. Trinta por cento dos jovens afirmam que a principal motivação é o entretenimento, enquanto 28% destacam o interesse pela tecnologia. Outros fatores incluem a busca por conselhos (18%), a disponibilidade constante da IA (17%) e a ausência de julgamentos (14%). Curiosamente, 12% dizem sentir-se mais à vontade para compartilhar segredos com um companheiro de IA do que com amigos ou familiares.
Esse panorama indica que as inteligências artificiais ocupam um espaço híbrido: são vistas tanto como ferramentas de experimentação quanto como confidentes virtuais em momentos de solidão.

Relações e confiança nos sistemas
Contudo, a pesquisa revela que apenas 23% dos adolescentes confiam plenamente nas informações oferecidas por esses sistemas, enquanto metade declara não confiar. Os mais jovens (13–14 anos) demonstram maior confiança do que os mais velhos (15–17), evidenciando vulnerabilidades distintas entre faixas etárias.
Outro dado relevante é que 31% dos adolescentes consideram as conversas com IAs tão satisfatórias quanto as realizadas com amigos de verdade, e 10% chegam a avaliá-las como mais satisfatórias. Apesar disso, 67% ainda preferem a interação humana, apontando a manutenção de vínculos sociais como prioridade.
Entretanto, um terço dos usuários (33%) recorreu a companheiros de IA em conversas sérias no lugar de pessoas reais, o que levanta alertas sobre isolamento social e sobrecarga emocional depositada em sistemas sem preparo humano.
Riscos à privacidade e experiências negativas
Por outro lado, os riscos são significativos. Um terço dos adolescentes relatou sentir-se desconfortável com falas ou atitudes de companheiros de IA, embora 66% nunca tenham vivenciado esse problema. Ainda assim, a ausência de desconforto não significa interações seguras, já que muitos jovens podem não reconhecer conteúdos inapropriados.
Adicionalmente, 24% dos usuários compartilharam informações pessoais, como nome real, localização ou segredos íntimos. Esse comportamento expõe adolescentes a termos de uso abusivos. Plataformas como Character.AI, por exemplo, possuem licenças que permitem armazenar e até comercializar indefinidamente os conteúdos compartilhados pelos usuários.
Esse quadro evidencia a necessidade urgente de regulamentações mais rígidas e políticas claras de proteção de dados, especialmente porque a maioria dos adolescentes não compreende a extensão de tais contratos.
Impactos sociais e educacionais
Ademais, o estudo revela que 39% dos adolescentes aplicam na vida real habilidades sociais praticadas com IAs, como iniciar conversas, expressar emoções ou pedir desculpas. Essa transferência sugere que, em alguns casos, os companheiros digitais podem servir como ambientes de treino social.
Mesmo assim, 80% dos jovens afirmam passar mais tempo com amigos reais do que com IAs, o que reforça que as relações humanas permanecem no centro da vida social. Para especialistas, esse equilíbrio indica que, embora populares, os sistemas ainda não substituem vínculos autênticos.
As escolas também possuem papel fundamental. O relatório recomenda que instituições desenvolvam currículos de letramento digital que expliquem como esses sistemas funcionam, incluindo os riscos de manipulação emocional e privacidade. Além disso, professores devem ser treinados para identificar padrões preocupantes, como isolamento ou apego excessivo a IAs.
Caminhos para famílias, empresas e governos
Finalmente, o relatório apresenta recomendações práticas. Para os pais, a orientação é conversar abertamente sobre o tema, observar sinais de alerta e explicar que companheiros de IA não substituem profissionais de saúde mental. Já para as empresas, as sugestões incluem implementar sistemas reais de verificação etária, limitar o uso em situações de risco e proibir que as IAs assumam falsamente credenciais terapêuticas.
Governos, por sua vez, devem estabelecer padrões de segurança, proibir contratos abusivos para menores de idade e financiar pesquisas sobre impactos de longo prazo. Também é necessário criar mecanismos de fiscalização e responsabilização para empresas que coloquem adolescentes em risco.
O estudo da Common Sense Media traz um retrato ambivalente: de um lado, revela o potencial dos companheiros de IA como ferramentas de apoio, curiosidade e aprendizado social; de outro, evidencia riscos graves ligados à privacidade, confiança e saúde mental. A presença dessas plataformas na vida de milhões de adolescentes não pode ser ignorada. Cabe à sociedade — famílias, educadores, empresas e governos — encontrar o equilíbrio entre inovação e proteção.
Anand Rao
Editor Chefe
Cultura Alternativa