Crônica Literária – Decepcionado com pessoas que não se impõem
Ele acordou cedo, como fazia todos os dias, um trabalhador da madrugada. OEra como se uma névoa fria estivesse instalada dentro de si, impenetrável.
Passou a mão pelo rosto cansado, refletindo as noites mal dormidas, as preocupações constantes, os diálogos internos que nunca cessavam.
Por tanto tempo, ele havia se dedicado a uma missão invisível: despertar aqueles que o cercavam, mostrar-lhes o valor da independência, da autenticidade. Mas a verdade era amarga e agora impossível de ignorar. Ele falhara.
Por anos, ele tentou fazer com que as pessoas ao seu redor enxergassem o valor de se impor, de lutar por suas convicções, de não ceder às influências rasas e manipuladoras. Amava essas pessoas, as via como seres de imenso potencial, mas o choque da realidade foi devastador.
Enquanto ele construía pontes, elas optavam por seguir trilhas abertas por outros, muitas vezes menos esclarecidos, guiadas por uma falsa sabedoria que, para ele, soava superficial e vazia.
Ele não entendia como preferiam aquela passividade, como se deixavam moldar por influências tão limitadas. Ele sentia uma frustração crescente, como se estivesse nadando contra uma maré imbatível.
Com o tempo, o desgaste emocional se acumulou. Ele queria vê-lad crescendo, assumindo o controle de suas vidas, enfrentando desafios com coragem. Mas, em vez disso, o que viu foi uma submissão crescente. E isso o corroeu por dentro. Ele se dedicara tanto a ensiná-las,a guiá-las, mas, ao final, elas optaram pelo conforto do conformismo.
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Crônica Literária – Decepcionado com pessoas que não se impõem
Foi nesse momento que ele percebeu que havia uma escolha que ele não podia fazer por elas. Cada um, no fundo, tinha o poder de decidir seu caminho, e elas haviam decidido se curvar diante de uma vida sem desafios, sem esforço, e, talvez, sem plenitude.
A decepção foi grande demais para ser suportada facilmente. Aquele idealista que acreditava no poder transformador do conhecimento e da autonomia começou a afundar em uma espiral de melancolia. A tristeza o dominou de uma forma que ele jamais imaginara possível.
Ele, que sempre fora tão cheio de vigor, de sonhos, agora se via isolado, devastado por um sentimento de impotência. Ele tentou entender, tentou justificar suas escolhas, mas nada parecia fazer sentido. A depressão o atingiu como uma tempestade inesperada.
Sentado em silêncio, ele refletia sobre sua própria vida. Havia se afastado de outros entes queridos no passado, acreditando que poderia ter uma relação mais verdadeira com eles. Mas agora, ao ver-se sozinho, a realidade era outra.
Ele percebeu que, na verdade, nunca havia conseguido estabelecer a conexão que desejava. Aqueles em quem depositara sua fé haviam escolhido um caminho diferente, um caminho que ele não conseguia compreender.
Aos poucos, ele começou a entender algo primordial: não poderia mais se consumir tentando mudar os outros. Ele precisaria mudar a si mesmo. Decidiu então se afastar, física e emocionalmente, daquelas pessoas que tanto amava, mas que o desapontavam profundamente, diariamente.
Não havia mais o que pudesse fazer por elas. Elas haviam feito suas escolhas, e ele, agora, teria que fazer as dele.
Esse afastamento, inicialmente doloroso, começou a se transformar em algo mais. Ele começou a redirecionar sua energia para si mesmo. Começou a cuidar de sua saúde, de seus sonhos esquecidos, de seus próprios ideais. Agora, era o momento de reconectar-se com sua essência.
Não foi um processo rápido. Ainda havia dias de tristeza, de dúvidas, de incertezas. Mas, ao mesmo tempo, ele começou a sentir uma força que antes não reconhecia em si. Talvez, paradoxalmente, a solidão lhe trouxesse a liberdade que tanto buscara nos outros.
Ele passou a aceitar que nem todos estavam prontos para a jornada que ele havia escolhido, e que isso não os fazia menos dignos de sua compaixão, apenas diferentes.
Com o tempo, ele viu sua vida se transformar. A dedicação que antes empregava para tentar moldar as escolhas dos outros foi direcionada para seus próprios projetos. E, sem a carga emocional de carregar o peso das decisões alheias, ele encontrou uma leveza que há muito tempo não sentia.
Seus dias, antes repletos de frustração e expectativa, agora estavam cheios de realização e paz. Ele descobriu o prazer de estar sozinho, de fazer as próprias escolhas sem se preocupar com a aprovação ou o entendimento dos demais.
O amor que sentia por aqueles que havia tentado guiar nunca desapareceu. Pelo contrário, ele continuou a amá-los profundamente, mas, agora, com um respeito renovado pelas escolhas deles, mesmo que essas fossem tão diferentes das suas.
Aprendeu que nem todos estão prontos para enfrentar as verdades que ele tanto prezava. Alguns preferem a segurança da ignorância, a tranquilidade da submissão, e isso, embora triste, não era algo que ele pudesse mudar.
Ele seguiu seu caminho, solitário, mas não mais perdido. E, nesse novo trajeto, encontrou a si mesmo. Uma vida de sucesso, não pelos padrões convencionais, mas por ter finalmente entendido que seu único dever era ser fiel a si mesmo.
Anand Rao
Cultura Alternativa