Gilberto Gil e família faz platéia do Jazz in Marciac entoar mantra africano
A penúltima noite de shows do Festival Jazz in Marciac (JIM) 2023 foi de reverência à música brasileira. Gilberto Gil e família fizeram a apresentação principal da noite
A pequena cidade do Sul da França, cujo festival é um dos mais importantes da Europa no gênero, recebeu brasileiros de todos os quadrantes europeus na sexta-feira.
Mas Gilberto Gil, vaca sagrada da Música Popular Brasileira, também atraiu muitos franceses, que já o haviam prestigiado em quatro edições anteriores do JIM.
Gilberto Gil e família
Eram 23h quando o octogenário baiano abriu seu concerto cantando a emblemática “Palco”. É perceptível que a idade começa a pesar sobre os ombros do artista. E para dosar energias, Gil intercala música com muita conversa, comunicando-se com a platéia por meio de um francês pausado, de bom nível.
Apresenta a numerosa banda de 11 músicos e cantores, dos quais sete são de sua família, com destaque para a neta Mariá, que ganha espaço nobre ao lado do avô solando em canção de Bob Marley.
Outro neto, o guitarrista Francisco, é o cantor principal de “Procissão”, que Gil conta ter gravado originalmente com os Mutantes.
O show vai chegando à metade e notamos claramente que Gil vai se soltando. O idoso cansado de voz cansada do início vai dando lugar, digamos assim, a um monsieur de cerca de 65 anos.
Gilberto Gil e família
O concerto se embala e vêm os hits “Tempo Rey”, “Extra”, Aquele Abraço”, ” Soy Loco Por Ti América”, Toda Menina Baiana, Realce e o baião “Vem Morena”, de Luiz Gonzaga,
Gil, família e a MPB ajudam a aquecer a fresca noite de Marciac (faz um friozinho incomum para esta época do ano), mas duas observações se fazem pertinentes: O som está bem ruim sob a lona do Chapiteau, com lotação de 7 mil pessoas quase esgotada; a banda é no máximo razoável.
Gil sempre deu emprego para excelentes músicos, mas com a família sempre crescendo, parece que falta cachê para distribuir além dos muros de sua grande casa.
O clã toca por uma hora e 47 minutos, e quando o show acaba já é madrugada de sábado. A força e representatividade cultural deste octogenário brasileiro impressiona a todos.
Os 11 voltam para um grandemente solicitado bis. Gil, vestido de branco, tal qual um preto velho, começa a entoar à capela o hino nagô “Emoriô”, composição dele e do recém falecido João Donato.
O bordão “Êeeeeeeeeemoriô” se espalha como pólvora pela platéia. Gil e a família deixam o palco mas o hino continua a ser entoado e por cerca de 15 minutos é a trilha sonora dos que deixam para traz o Chapiteau para ganhar as ruas da pequena cidade e continuar a comunhão cultural e racial lá fora.
No dia seguinte, caminho por Marciac em companhia de amigos franceses que fazem questão de contar uns aos outros que sou um jornalista brasileiro.
Então, tenho de responder muitas perguntas sobre a música, a vida e até sobre a carreira política de Gil.
Com isso, acabo também me sentindo um membro da família deste grande mestre da MPB.
Carlos Dias Lopes