Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli – Uma Vida Dedicada à Ciência e ao Ensino

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli – Uma Vida Dedicada à Ciência e ao Ensino

Nascimento

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli nasceu em 1929, na cidade de Buriti Bravo, no Maranhão. Desde jovem, demonstrou interesse pelas ciências naturais, o que a levou a cursar História Natural na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil (atual UFRJ), concluindo o curso em 1953 com os títulos de bacharel e licenciada. Sua formação abrangia áreas como biologia, mineralogia e geologia, fornecendo uma base sólida para sua futura carreira acadêmica.

Após a graduação, Maria do Socorro iniciou sua trajetória docente em 1957, ao ser contratada pela Campanha de Formação de Geólogos para integrar o curso de Geologia da Universidade do Recife (atual UFPE). Ela foi uma das primeiras mulheres a lecionar Geociências no Brasil, ministrando disciplinas como Cristalografia, Mineralogia e Petrografia. Sua atuação pioneira em um ambiente predominantemente masculino destacou-se pelo rigor metodológico e pela dedicação ao ensino.

Em 1971, transferiu-se para Brasília com sua família, após ser convidada para integrar o corpo docente da Universidade de Brasília (UnB). Na UnB, continuou sua carreira acadêmica no Instituto de Geociências, onde permaneceu até se aposentar em 1994. Durante esse período, contribuiu significativamente para a estruturação dos laboratórios de Mineralogia e Cristalografia, viabilizando a chegada de modernos equipamentos de microscopia e difração de raios X.

Além de sua atuação docente, Maria do Socorro realizou estágios técnicos no exterior, especializando-se em técnicas físico-químicas aplicadas à mineralogia em Lisboa e em cristalografia em Amsterdã. Essas experiências internacionais enriqueceram sua formação científica e ampliaram sua visão de mundo, fortalecendo sua autoridade acadêmica no Brasil.

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli

Família

A vida pessoal de Maria do Socorro esteve profundamente entrelaçada à sua trajetória profissional. No final dos anos 1950, enquanto lecionava na Universidade do Recife, conheceu o geólogo indiano Adusumilli Bhaskara Rao, recém-chegado ao Brasil como professor de Mineralogia.

O encontro entre dois apaixonados pela ciência logo se transformou em uma sólida parceria afetiva e intelectual. Casaram-se em 1960 em uma cerimônia íntima realizada na casa do professor Karl Beurlen, no bairro de Boa Viagem, Recife.

O casamento representou não apenas a união de duas culturas – brasileira e indiana – mas também o início de uma vida acadêmica compartilhada.

Do casamento nasceram dois filhos: Anand Rao e Savithri Maria. Ambos cresceram imersos em um ambiente familiar pautado pela cultura, ciência e diálogo multicultural. A educação dos filhos foi marcada pela valorização da ética, do estudo e da liberdade de pensamento.

Anand Rao seguiu caminhos na área jornalística e cultural, enquanto Savithri trilhou carreira em tecnologia e serviços públicos. Ambos os filhos mantêm laços estreitos com a trajetória dos pais, celebrando sua herança familiar e intelectual com orgulho.

A família Adusumilli mudou-se para Brasília em 1971, após serem convidados para integrar o corpo docente da Universidade de Brasília. Na capital federal, o casal educador construiu uma vida dedicada à formação de jovens geólogos e à construção do Instituto de Geociências da UnB.

A casa dos Adusumilli tornou-se ponto de encontro de estudantes, professores e amigos, sendo lembrada por sua hospitalidade e pelo aroma das especiarias indianas misturado ao café brasileiro.

O marido de Maria do Socorro, Bhaskara Rao, faleceu em 2003. A perda foi profunda, mas ela seguiu adiante amparada pelo carinho dos filhos e pelo legado construído a quatro mãos.

Hoje, aos 95 anos, vive cercada pela família, que reconhece sua força, sabedoria e a alegria que ainda transmite. Os netos a visitam com frequência, e os filhos continuam reverberando seu nome em eventos, entrevistas e homenagens que celebram sua contribuição ao país.

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli

Vida Acadêmica

Maria do Socorro iniciou sua carreira docente em 1957, ao ser contratada pela Campanha de Formação de Geólogos para integrar o curso de Geologia da Universidade do Recife, atual UFPE. Tornou-se uma das primeiras professoras do curso e também uma das raríssimas mulheres a ensinar Geociências no Brasil da época.

Ministrou disciplinas fundamentais como Cristalografia, Mineralogia e Petrografia, sendo considerada por alunos e colegas como uma docente respeitada, metódica e generosa.

Com a transferência para Brasília, passou a atuar no Instituto de Geociências da UnB, onde foi professora por mais de duas décadas.

Na universidade, além das aulas, contribuiu de forma decisiva para a estruturação dos laboratórios de Mineralogia e Cristalografia, viabilizando a chegada de modernos equipamentos de microscopia e difração de raios X, muitos deles importados da Alemanha e Japão com apoio do CNPq. Foi bolsista de produtividade e teve atuação constante no ensino, na pesquisa e na extensão universitária.

Em 1977, conquistou o título de livre-docência pela Universidade Federal de Minas Gerais com a tese sobre nióbio e tântalo em pegmatitos nordestinos.

A aprovação na banca conferiu-lhe o reconhecimento acadêmico equivalente ao doutorado, que somado à sua vasta produção científica, consolidou sua posição como especialista nacional em mineralogia. Em 1986, realizou pós-doutorado na Université d’Orléans, na França, onde se aprofundou em mineralogia óptica e técnicas de análise de minerais radioativos.

Durante sua trajetória, orientou diversos estudantes e deixou um legado de formação. Entre suas orientandas, destaca-se Márcia Abrahão Moura, que foi reitora da UnB de 2016 a 2024. A influência da professora ultrapassou as salas de aula: ela participou de bancas de concurso, comissões avaliadoras, congressos nacionais e internacionais, e foi ativa nas sociedades brasileiras de Geologia e Cristalografia, onde chegou a integrar a diretoria.

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli

Prêmios e Reconhecimento

Ao longo de sua carreira, Maria do Socorro Adusumilli foi agraciada com diversos prêmios e homenagens. Em 1981, recebeu a Medalha Sousândrade e o Diploma de Mérito Universitário concedidos pela Universidade Federal do Maranhão, em reconhecimento à sua destacada atuação científica e por representar o Maranhão com excelência. Foi um momento marcante em sua vida, unindo a valorização da terra natal com o prestígio conquistado nacionalmente.

Na Universidade de Brasília, é lembrada como uma das mulheres que fizeram história na instituição. Seu nome figura em exposições, homenagens e memoriais sobre as pioneiras da educação superior brasileira. A longevidade de sua carreira e a influência sobre diversas gerações de alunos transformaram-na em referência no ensino de geociências.

Além das distinções formais, o reconhecimento mais significativo veio de seus estudantes, muitos dos quais mantêm contato até hoje. Alunos que se tornaram professores, pesquisadores e profissionais do setor mineral atribuem a ela as bases do conhecimento que carregam. Em entrevistas recentes, ex-alunos relataram com emoção as primeiras aulas de cristalografia com Maria do Socorro, destacando como sua forma de ensinar os fez se apaixonar pela geologia. Esses testemunhos reforçam a dimensão humana de seu legado, construído com empatia, dedicação e compromisso com o saber.

Em 2023, durante uma sessão solene da Assembleia Legislativa de Pernambuco em homenagem ao seu marido, Bhaskara Rao, a professora foi homenageada de forma indireta. Seu filho, Anand Rao, leu um discurso de sua autoria, em que ela expressava gratidão à terra que acolheu sua trajetória e à comunidade acadêmica que a valorizou. Foi mais um momento em que sua memória e contribuição foram reverenciadas publicamente.

Outro reconhecimento importante ocorreu no contexto da própria Universidade de Brasília. Em 2022, a UnB incluiu Maria do Socorro na série de reportagens “Mulheres que Fizeram História na UnB”, destacando suas contribuições na formação de laboratórios, na docência de excelência e na orientação de lideranças acadêmicas femininas. A série contribuiu para eternizar o nome da professora entre os grandes pilares da instituição.

Inovações na Arte de Ensinar

Desde seus primeiros anos de docência, Maria do Socorro destacou-se por métodos inovadores. Seus cadernos de aulas práticas em Cristalografia e Mineralogia Óptica foram pioneiros na padronização de práticas laboratoriais em geociências, facilitando o aprendizado em disciplinas tradicionalmente consideradas difíceis. Com esquemas, desenhos e instruções detalhadas, os materiais se tornaram referência entre estudantes da UnB e de outras universidades.

A professora também foi responsável por implantar e organizar o Laboratório de Difratometria de Raios X da UnB, um marco em infraestrutura para pesquisa em mineralogia. Ela liderou o processo de aquisição de equipamentos sofisticados, negociando diretamente com fornecedores e órgãos de fomento. Essa proatividade permitiu à universidade competir em nível internacional, atraindo estudantes e pesquisadores.

Outro aspecto inovador foi sua capacidade de adaptar o ensino ao perfil de cada aluno. Maria do Socorro incentivava perguntas, acolhia dúvidas e usava analogias para tornar compreensíveis os conceitos mais abstratos. Seu lema era: “se o aluno não entendeu, o professor deve procurar outra forma de explicar.” Esse compromisso com a aprendizagem individualizada fazia de suas aulas experiências memoráveis.

Sua postura em sala era respeitosa e firme. Mesmo em turmas predominantemente masculinas, era tratada com deferência e admiração. Ex-alunos a chamavam de “um anjo” pela paciência e pela autoridade natural com que conduzia as aulas. Foi exemplo de que se pode ensinar com gentileza sem perder o rigor, e que mulheres podem ocupar qualquer espaço no meio científico com competência e respeito.

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli

Vida na Longevidade

Aos 95 anos, Maria do Socorro Adusumilli continua sendo inspiração para quem a conhece. Mantém a saúde com hábitos saudáveis, autonomia física e lucidez admirável. Em entrevista recente, declarou: “não sou daquelas velhinhas que ficam andando encurvadas. Eu me cuido.” Essa vitalidade na terceira idade é reflexo de uma vida equilibrada entre corpo, mente e afeto.

Reside em Brasília, onde convive com os filhos e netos. Sua rotina envolve leitura, organização de documentos acadêmicos, revisitação de memórias e conversas familiares. Gosta de ouvir música, acompanha notícias científicas e, com ajuda da família, navega pelo mundo digital. O tempo livre é preenchido com serenidade e gratidão pela jornada vivida.

Mesmo aposentada desde 1994, continua sendo consultada por ex-alunos, colegas e instituições que desejam registrar sua história. Participa, quando possível, de eventos em sua homenagem, sempre com discrição e modéstia. Sua presença, mesmo que simbólica, representa um elo entre passado e futuro, tradição e renovação.

Sua longevidade não é apenas biológica, mas simbólica. Está na memória dos que a tiveram como professora, nos laboratórios que ajudou a construir, nas pesquisas que orientou e nas instituições que ajudou a consolidar. É prova de que vidas bem vividas não se apagam – multiplicam-se.

Conclusão

Maria do Perpétuo Socorro Adusumilli é, sem dúvida, um dos nomes mais importantes da história da educação geológica brasileira. Sua trajetória é exemplo de pioneirismo, resiliência, sabedoria e amor ao ensino. Da infância no Maranhão às salas de aula da UnB, da juventude nos laboratórios europeus à maturidade serena em Brasília, construiu uma biografia rara e admirável.

Foi chefe do Departamento de Geociências da Universidade de Brasília entre 1983 e 1987, período em que fortaleceu a pesquisa, consolidou laboratórios e estimulou a integração entre graduação e pós-graduação. Sua gestão foi marcada por planejamento, diálogo e eficiência, qualidades reconhecidas pelos pares acadêmicos.

Além de formadora de gerações, foi construtora de espaços de ensino e pesquisa. Desafiou barreiras de gênero com elegância e coragem, mostrando que a ciência se faz com inteligência, mas também com afeto e escuta. Seu legado está vivo nos corredores da UnB, nos livros, nas memórias de seus alunos e no exemplo ético que deixou.

A história de Maria do Socorro é uma celebração da educação, da ciência, da mulher e da longevidade ativa. Que seu nome continue sendo lembrado e reverenciado pelas futuras gerações, como símbolo de uma vida que realmente fez a diferença.

Anand Rao e Agnes Adusumilli

Editores Chefes

Cultura Alternativa