Estreia Matutando de Matu Miranda reafirma a nova MPB de 2024
Matutando de Matu Miranda estreia em Fortaleza com pluralidade
Matutando de Matu Miranda teve sua estreia oficial no palco do Theatro José de Alencar, em Fortaleza, no dia 20 de setembro de 2024. O espetáculo marcou a entrada formal do artista na cena fonográfica nacional, ao lançar seu primeiro álbum completo. A escolha da cidade não foi aleatória: foi lá que Matu iniciou seus estudos e relações musicais ainda na juventude.
Diferentemente de lançamentos digitais anônimos, a estreia aconteceu com presença de público, músicos convidados e orquestração cuidadosa. A noite contou com nomes como Vinícius Matos, Nonato Lima e Lucas Arruda, que reforçaram a ambiência colaborativa do álbum. O evento foi promovido com apoio institucional e marcou o início de uma turnê cuidadosamente roteirizada.
A atmosfera da estreia refletiu o conteúdo do disco: múltipla, leve, mas densa em significado. Ao conjugar intimismo com arranjos complexos, Matu Miranda construiu uma narrativa cênica que prepara o ouvinte para a escuta atenta. Cada música surgiu no palco como uma miniatura emocional.

Composições autorais revelam equilíbrio entre técnica e emoção
Desde a primeira faixa, Matutando demonstra consistência estética. O álbum é fruto de três anos de composição, pesquisa e gravação em Fortaleza, Rio e São Paulo. A produção foi cuidada e distribuída por canais internacionais como AWAL e Mocloud, indicando o projeto como uma estreia com fôlego global.
Sob outro aspecto, cada faixa tem estrutura e linguagem próprias, demonstrando a habilidade de Matu em articular gêneros e técnicas. O artista transita entre a suavidade melódica da MPB e a imprevisibilidade harmônica do jazz, utilizando recursos como o scat vocal não apenas como ornamento, mas como núcleo expressivo.
Para além da técnica, há camadas emocionais que sustentam a escuta. Em “Renova”, última faixa lançada antes do disco, Matu canta com Lenine sobre transformação. A letra fala de deixar cair o que não serve mais. A combinação entre melodia em espiral e timbres orgânicos cria um ponto de repouso dentro do álbum.
Participações especiais ampliam o alcance estético do disco
Inicialmente, a presença de nomes consagrados no álbum dá lastro e autenticidade ao projeto. Carlos Malta, Arismar do Espírito Santo, Bebê Kramer, Michael Pipoquinha e Lenine aparecem em faixas que exigem precisão técnica e entrosamento artístico. As escolhas não foram casuais, mas coerentes com o tom geral do trabalho.
Na faixa “Lunar”, Bebê Kramer e Tunico dialogam com o sax soprano de Malta em uma estrutura quase camerística. A música parece flutuar entre o mundo real e uma paisagem onírica. Em “Reluzia”, Arismar assume o baixo acústico em contraponto à voz intimista de Matu, criando uma tensão harmônica sutil.
Como resultado, o álbum constrói um mosaico de interações. Não se trata de convidados que “empréstam” seus nomes, mas de presenças que multiplicam os sentidos das canções. O disco soa coletivo, mas sem diluir o protagonismo autoral. Matu lidera com segurança, mesmo entre gigantes.
Poética musical valoriza o olhar infantil sobre a vida adulta
Conforme indicado no título do álbum, a ideia de “matutar” serve como chave poética para a escuta. Pensar com calma, refletir demoradamente e recuperar um olhar lúdico sobre o mundo são gestos centrais das letras. O disco propõe um tempo paralelo ao da produtividade e da pressa.
Além do verbo, o disco constrói um repertório de imagens suaves e acessíveis. Há campo, vento, saudade e reinício. Matu escreve como quem observa o mundo com ternura, mas sem cair no sentimentalismo. Ele captura detalhes que a vida urbana costuma atropelar — e os devolve ao ouvinte como presentes sonoros.
Por fim, esse tom poético é sustentado pela performance vocal, que evita os excessos dramáticos comuns a estreias autorais. A contenção de Matu é uma escolha estética. Em vez de bradar, ele murmura. Em vez de descrever, ele sugere. Esse gesto convida o público a preencher as lacunas com as próprias emoções.
Turnê nacional e internacional fortalece o nome do artista
Logo após o lançamento, Matu embarcou em uma turnê nacional com passagens por Campo Grande, São Paulo, Rio e Fortaleza. Cada show adaptou-se à cidade e ao público, ora em formato intimista com voz e violão, ora com banda completa. O repertório oscilava entre autorais e releituras personalizadas.
Na sequência, o artista viajou à Europa, apresentando-se em Lisboa, Amsterdã, Munique, Barcelona e Paris. A recepção foi positiva, com cobertura da imprensa cultural local e presença de público brasileiro e europeu. Matu levou não só suas composições, mas também a estética de uma nova MPB híbrida e reflexiva.
Tais experiências ampliam o escopo da carreira e demonstram que Matutando não é um disco “de estreia” no sentido limitado. É um trabalho que nasce pronto para o mundo, não apenas como cartão de visitas, mas como manifesto artístico. A cada show, Matu consolida essa proposta diante de plateias variadas.

Considerações sobre a relevância de Matutando na MPB
Dessa forma, Matutando se destaca não apenas como um conjunto de boas canções, mas como um projeto coeso, inovador e emocionalmente ressonante. A estreia de Matu Miranda reposiciona os parâmetros do que se espera de um novo nome da MPB: ele não repete fórmulas, mas constrói caminhos próprios.
A recepção crítica indica que o disco toca diferentes públicos, do amante da canção brasileira tradicional ao ouvinte contemporâneo de jazz e pop acústico. A presença de figuras consagradas não ofusca o novato, mas sim o reconhece como parte do presente da música brasileira.
Por fim, se uma faixa pudesse sintetizar a alma do disco, “Agora”, lançada com Michael Pipoquinha, talvez seja a mais fiel. É com ela que Matu avisa: não veio testar. Veio propor. E quem escuta Matutando de Matu Miranda entende que estamos diante de um artista pronto — e já em movimento.
Anand Rao
Editor Chefe
Cultura Alternativa