O exagero do calendário e salário no futebol brasileiro - Cultura Alternativa

O exagero do calendário e salário no futebol brasileiro

O exagero do calendário e salário no futebol brasileiro

O exagero do calendário e salário no futebol brasileiro abre a discussão sobre os dois maiores desequilíbrios do modelo atual. De um lado, o calendário sufoca clubes e jogadores com excessiva carga de jogos; de outro, salários estratosféricos oneram as finanças dos clubes e ampliam a desigualdade interna.

Excesso de jogos e desgaste físico

Além de um calendário extenso, o Campeonato Brasileiro da Série A exige que os clubes disputem 38 partidas entre maio e dezembro, enfrentando todos os adversários duas vezes. Em paralelo, muitos times ainda participam de campeonatos estaduais, Copa do Brasil e competições continentais, como a Libertadores e a Sul-Americana. Essa sobrecarga resulta em uma maratona de quase duas partidas por semana, limitando períodos de descanso e comprometendo a preparação física. O resultado é o aumento das lesões e a queda no nível técnico de muitas equipes.

Contudo, essa rotina extenuante não impacta apenas os atletas, mas também a qualidade do espetáculo oferecido ao torcedor. Jogos em excesso e pouco tempo de treinamento reduzem a intensidade e dificultam a assimilação de novas propostas táticas. Como consequência, o futebol brasileiro, que já foi referência mundial, enfrenta dificuldades para competir em pé de igualdade com os grandes centros europeus.

Adicionalmente, entidades como a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) vêm sendo pressionadas a rever o modelo atual. A discussão sobre reduzir estaduais ou alongar a temporada é recorrente, mas os interesses comerciais e políticos ainda se sobrepõem ao bem-estar dos atletas e à qualidade do produto entregue.

Folhas salariais astronômicas

Entretanto, se o calendário já representa um desafio, os salários pagos nos grandes clubes chamam ainda mais atenção. Estima-se que o Flamengo desembolse aproximadamente R$ 39 milhões mensais em sua folha salarial, seguido pelo Palmeiras, com cerca de R$ 34 milhões. O Corinthians aparece com R$ 21 milhões, o Vasco com R$ 20 milhões, e o Fluminense chega próximo de R$ 18 milhões mensais. Em 2024, o aumento nos gastos com salários foi de 22% em relação ao ano anterior, elevando o total desembolsado pelos 20 principais clubes a quase R$ 5 bilhões.

Esses valores contrastam com a realidade financeira da maioria das instituições, que dependem de empréstimos, antecipação de receitas e vendas de jogadores para manter as contas em dia. Muitos clubes pequenos, por outro lado, mal conseguem arcar com salários em dia, ampliando o abismo competitivo entre as diferentes divisões do futebol brasileiro.

Além disso, é comum que os salários sejam pagos em formatos diversos, incluindo carteira de trabalho, direitos de imagem e até direitos de arena. Essa prática, embora legal, é utilizada como forma de reduzir a carga tributária, mas expõe fragilidades na estrutura de arrecadação e fiscalização do setor.

Desigualdade e modelos insustentáveis

Porém, o aspecto mais preocupante é a disparidade entre os jogadores. Atletas titulares de grandes clubes chegam a receber entre R$ 800 mil e R$ 2 milhões por mês, enquanto reservas ou jovens da base ficam em faixas de R$ 80 mil a R$ 200 mil. Essa desigualdade interna, somada ao contraste com clubes de menor porte, mostra como o futebol brasileiro se apoia em um modelo concentrador e de alto risco financeiro.

Do ponto de vista esportivo, o impacto também é claro. Jogadores sobrecarregados por um calendário intenso não conseguem render o esperado, ao mesmo tempo em que altos salários geram pressão desmedida e cobranças que muitas vezes não se convertem em títulos. A combinação de desgaste físico e gastos exorbitantes acaba minando a sustentabilidade dos clubes e comprometendo o futuro da modalidade no país.

Por fim, o duplo exagero — calendário inflado e salários astronômicos — se tornou um obstáculo para a evolução do futebol brasileiro. É preciso um esforço coletivo entre federações, clubes e sindicatos para equilibrar interesses, priorizar a saúde dos atletas e implantar uma gestão mais responsável. Sem isso, o risco é transformar a paixão nacional em um espetáculo cada vez mais caro, desigual e insustentável.


Anand Rao
Editor Chefe
Cultura Alternativa