Geração Z e trabalho
Jovens mascaram tarefas no ambiente corporativo como forma de se protegerem diante de um cenário profissional instável e competitivo. Em tempos nos quais a inteligência artificial começa a substituir funções repetitivas, os mais novos alimentam o temor de perder o emprego. Segundo levantamento divulgado na reportagem do Financial Times, 37% dos trabalhadores da geração Z declaram esse receio de maneira clara.
Além disso, a cultura de performance e presença influencia diretamente esse comportamento. Muitos gestores ainda associam a produtividade à permanência física nos escritórios e estabelecem um ambiente de vigilância sutil. Nesse contexto, os jovens fingem estar ocupados como mecanismo de defesa psicológica e estratégia de permanência.
No entanto, essa prática não revela má-fé. Os jovens utilizam esse recurso de forma adaptativa, diante da exigência de entregas constantes e supervisão intensa. Essa geração cresceu vivenciando períodos de instabilidade, como a crise financeira de 2008 e a pandemia, e por isso enxerga o mercado com desconfiança. Em vez de buscar destaque, muitos preferem garantir a própria sobrevivência profissional.

Estratégias para parecer produtivo tomam redes sociais
Em primeiro lugar, as redes sociais exercem papel central na divulgação de técnicas para mascarar tarefas. Usuários de TikTok e Instagram criam tutoriais detalhados sobre como simular produtividade e enganar supervisores. Milhões de pessoas assistem a vídeos com orientações sobre posicionamento de janelas no navegador e expressões faciais convincentes.
Por outro lado, influenciadores usam personagens como George Costanza, da série “Seinfeld”, como ícones culturais que justificam o comportamento. Eles indicam que parecer constantemente irritado transmite a imagem de sobrecarga. Outros sugerem assistir vídeos com fones de ouvido enquanto mantêm uma planilha aberta, criando ilusão de concentração.
Contudo, a prática não corresponde à procrastinação. Jovens trabalhadores tentam manter a própria relevância diante da lógica corporativa que valoriza presença acima da entrega real. Simular envolvimento evita cobranças, assegura visibilidade e projeta uma imagem de engajamento profissional.
Chefes exigem presença, mas ignoram bem-estar mental
Assim, gestores voltaram a priorizar a presença física como sinal de comprometimento à medida que os escritórios retomam as atividades. Essa pressão estabeleceu uma contradição evidente. A empresa exige inovação e resultados, mas insiste na permanência constante como se isso garantisse produtividade.
Ainda assim, a diretora de operações da Gen Z Lab, Amanda Edelman, observa que muitos jovens se sentem forçados a parecer hiperprodutivos. Eles acreditam que precisam atingir o máximo de rendimento para evitar substituição por inteligência artificial. Esse cenário compromete a saúde emocional e bloqueia a criatividade.
Portanto, especialistas como Caitlin Duffy, do instituto Gartner, propõem um novo modelo de diálogo entre empresas e equipes. Líderes devem ouvir com mais atenção, criar indicadores mais humanos de produtividade e promover relações baseadas na confiança. Somente assim será possível romper o ciclo de ansiedade que domina o ambiente de trabalho.
Cultura do “antitrabalho” cresce com influenciadores
Consequentemente, influenciadores que criticam o modelo corporativo tradicional ganham força entre os jovens. Gabrielle Judge, por exemplo, produz conteúdos sobre “antitrabalho” e atrai mais de 500 mil seguidores com reflexões sobre o esgotamento contemporâneo. Ela afirma que os mais jovens não acreditam que o trabalho garantirá estabilidade no futuro.
Em contraste, esse discurso revela um incômodo coletivo e crescente. Muitos jovens rejeitam a ideia de viver em função do trabalho e querem inverter a lógica, trabalhando para viver. A pandemia ampliou essa percepção e trouxe à tona temas como saúde mental, equilíbrio e propósito no fazer profissional.
Por fim, algumas pessoas acusam esse movimento de estimular irresponsabilidade. Outras, porém, enxergam nele uma crítica necessária ao sistema atual. O fenômeno revela um apelo por mudanças no ambiente corporativo e exige abertura para práticas mais flexíveis e humanas.
Desconfiança corporativa molda comportamento juvenil
Por consequência, a geração Z, nascida entre 1997 e 2010, cresceu observando pais demitidos, empresas falidas e promessas não cumpridas. Esses jovens demonstram desconfiança com relação às instituições corporativas. Muitos manifestam a sensação de que o trabalho não oferece suporte real à vida pessoal.
Logo, esse histórico de instabilidade transformou o mercado de trabalho em território de sobrevivência. Ao contrário dos baby boomers, que enxergavam o emprego como plano de longo prazo, os jovens priorizam mobilidade e evitam ambientes opressores. Fingir estar trabalhando passou a representar uma estratégia para manter o emprego.
Em resumo, líderes e departamentos de RH precisam reconhecer os sinais dessa mudança de mentalidade. A produtividade não se resume a relatórios entregues ou presenças marcadas. A motivação, o propósito e o bem-estar também influenciam diretamente o desempenho de qualquer profissional.

Fingir estar ocupado virou regra, não exceção
Todavia, o hábito de mascarar tarefas não representa um fenômeno isolado. Os dados indicam que a prática já se tornou comum no dia a dia de muitos jovens. Mais de um terço dos trabalhadores da geração Z revelam medo constante de perder o emprego, o que leva à simulação como mecanismo de proteção.
De modo geral, essa conduta não nasce da preguiça, mas da tensão permanente. Os jovens se veem pressionados a se destacar em mercados voláteis, onde esforço e entrega nem sempre geram reconhecimento. Ao perceberem que a presença conta mais do que os resultados, muitos recorrem a estratégias teatrais para garantir a permanência.
Finalmente, o desafio das empresas é criar um ambiente de confiança e clareza. Avaliar os profissionais com base em entrega real, ouvir com atenção e valorizar a individualidade são passos essenciais. Quando os jovens se sentem escutados, não precisam fingir produtividade, eles entregam de verdade.
Anand Rao e Agnes Adusumilli
Editores Chefes
Cultura Alternativa